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Fámilia ilustrada em Vidas Secas.

Fámilia ilustrada em Vidas Secas.
Uma ilustração feita por Vinícius Mattoso retratando uma fámilia em vidas secas seguindo abaixo com assinatura de Graciliano R. (Autor do livro).

sexta-feira, 25 de setembro de 2009

Graciliano Ramos


I - Biografia


Primogênito de de sesseis filhos do casal Sebastião Ramos de Oliveira e Maria Amélia Ramos, viveu os primeiros anos em diversas cidades do Nordeste brasileiro. Terminando o segundo grau em Maceió, seguiu para o Rio de Janeiro, onde passou um tempo trabalhando como jornalista. Voltou para o Nordeste em setembro de 1915, fixando-se junto ao pai, que era comerciante em Palmeira dos Índios, Alagoas. Neste mesmo ano casou-se com Maria Augusta de Barros, que morreu em 1920, deixando-lhe quatro filhos.

Foi eleito prefeito de Palmeira dos Índios em 1927, tomando posse no ano seguinte. Ficou no cargo por dois anos, renunciando a 10 de abril de 1930. Os relatórios da prefeitura que escreveu nesse período chamaram a atenção de Augusto Schmitd, editor carioca que o animou a publicar Caetés (1933).

Entre 1930 e 1936 viveu em Maceió, trabalhando como diretor da Imprensa Oficial e diretor da Instrução Pública do estado. Em 1934 havia publicado São Bernado, e quando se preparava para publicar o próximo livro, foi preso em decorrência do pânico insuflado por Getúlio Vargas após a Intentona Comunista de 1935. Com ajuda de amigos, entre os quais José Lins do Rego, consegue publicar Angústia (1936), considerada por muitos críticos como a melhor obra.

Foi libertado em janeiro de 1937. As experiências da cadeia, entretanto, ficariam gravadas em uma obra publicada postumamente, Memórias do Cárcere (1953), relato franco dos desmandos e incoerências da ditadura a que estava submetido o Brasil.

Em 1938 publicou Vidas Secas. Em seguida estabeleceu-se no Rio de Janeiro, como inspetor federal de ensino. Em 1945 ingressou no antigo Partido Comunista do Brasil - PCB (que nos anos sessenta dividiu-se em Paritdo Comunista Brasileiro - PCB - e Partido Comunista do Brasil - PCdoB), de orientação soviética; nos anos seguintes, realizaria algumas viagens a países europeus com a segunda esposa, Heloísa Medeiros Ramos, retratadas no livro Viagem e sob o comando de Luís Carlos Prestes (1954). Ainda em 1945, publicou Infância, relato autobiográfico.

Adoeceu gravemente em 1952. No começo de 1953 foi internado, mas acabou falecendo em 20 de março de 1953, aos 60 anos, vítima de câncer do pulmão.



II - Bibliografia


A obra de Graciliano Ramos é bastante heterogênea, formada por contos, crônicas, romances, memórias e ficção infantil.


Romance:

→ Caetés (1933)

→ São Bernardo (1934)

→ Angústia (1936)

→ Vidas Secas (1938)

→ Brandão entre o mar e o amor(1942, em colaboração com Jorge Amado, José Lins do Rego, Rachel de Queiroz e Aníbal Machado)

→ Histórias Verdadeiras (1951)

Memorialística:

→ Infância (1945)

→ Memórias do Cárcere (1953)

→ Viagem (1954)

→ Linhas Tortas(1962)

→ Viventes das Alagoas(1962)

Infantil:

→ Histórias de Alexandre (1944)

→ Dois Dedos (1945)

→ Histórias incompletas (1946)


III - Estilo do Autor

Graciliano é a maioridade literária da geração regionalista. Foi um escritor sem truques, sem falsa consciência aonde seu horizonte é a política, mas com essência das relações entre homem e natureza, onde fica pulsando como seu coração, que com muita astúcia, transfere as molas da tragédia social para os ciclos da natureza, onde a culpa, portanto, desaparece e onde a sociedade ironicamente parece inocentar-se.

Graciliano empregava termos nordestinos, não gostava de falar em público, sendo nomeado diretor da Instrução Pública de Alagoas, trabalhou intensamente e revolucionou os métodos de ensino, até hoje necessitados de reforma.

A modernidade de Graciliano Ramos não se relaciona com o movimento modernista ou com as modas literárias em voga no seu tempo. Escritor realista, clássico, denso, crítico e universalista, Graciliano Ramos explorou temas nacionais e regionais para expor, em suas personagens, as dores e sofrimentos comuns aos seres humanos. Sua obra se caracteriza pela poupança verbal, o parco uso de adjetivos e a sintaxe clássica, em oposição à liberdade gramatical dos modernistas e de prosadores do nordeste.

O estilo formal de escrita e a caracterização do eu em constante conflito (até mesmo violento) com o mundo, a opressão e a dor seriam marcas da literatura. Memória: Graciliano foi indicado ao premio Brasil de literatura.


IV - Característica do autor em sua obra


A qualidade principal da obra é que ele sintetiza a tragédia social nordestina no sertão nordestino, com uma linguagem levada aos limites da concisão e do aprimoramento, enfim, com um estilo que consegue ser artístico, sem a menor afetação.

Graciliano utiliza-se da técnica da concisão, ou seja, do estilo "seco", reduzido ao mínimo de palavras.

Graciliano mostra-nos que para sobreviver à seca, é preciso dispor de um atento instinto animal, é preciso estar sempre desperto para as variações da circunstância isso ele demonstra na figura de Fabiano.

O tempo é demonstrado pela quebra da monotonia, isso vai se combinando com o clima geral de incerteza e mesmice que não muda ao longo da obra.

O narrador é onisciente, porém, só mostra a intimidade das personagens quando esta esteja relacionada com aspectos da existência.

V - Análise Crítica


Graciliano Ramos no chamado romance do Nordeste, além de mostrar e denunciar as mazelas sociais, deu um nível literário,artístico à obra. É um escritor com um estilo próprio, com uma linguagem trabalhada. Não é um romancista na plena acepção da palavra, mas um bom contista e utilizou materiais já elaborados e até mesmo publicados para criar seus romances. Vidas Secas é montado num processo artesanal, ordenado à maneira de mosaico, não é um romance propriamente dito e sim uma coletânea de contos. São 13 capítulos autônomos, que se ligam pela repetição de alguns motivos.

Vidas Secas é um romance de estética realista naturalista é a dramática descrição de pessoas que não conseguem comunicar-se pois a terra é seca, mas o homem, também é seco: nem os opressores(patrão, soldado) e nem os oprimidos(família de Fabiano). Sabendo se que o mais importante não é a intriga mas o fundo sociológico e psicológico. Graciliano Ramos procura estudar o comportamento duma família extremamente rude e primitiva num meio ecologicamente severo e seco. Estuda as formas de raciocínio e linguagem, de adaptação ou revolta em diversas temperaturas psicológicas: as reações nos períodos de seca e fome, bem como nos períodos de fartura do inverno, as formas de comportamento no campo e na cidade, etc. O que interessa é o homem, o homem do sertão nordestino, o ser rude e quase primitivo pela hostilidade do meio físico e da injustiça humana. Graciliano Ramos conhecia a região e quis descrever o homem branco, rude e suas personagens são quase selvagens por isso o que elas pensam e falam merece ser anotadas.

Vidas Secas não é só o romance da seca, mas principalmente o romance da condição humana jogada entre a vida e a morte. As personagens deslocam-se para lugares distantes daquele em que se situa o conflito. Os retirantes recusam o presente e vão atrás de um sonho: casa para se abrigarem e trabalho para ganharem o suficiente para não morrer de fome.

Por ser um romance realista regionalista as descrições deveriam ser mais desenvolvidas. Se fala do verão, do inverno, das nuvens, do sol, de água ou dos mandacurus; as anotações "paisagísticas" são breves e explicativas, por que precisa destes elementos para estudar o comportamento psicológico do homem entregue a um meio ecologicamente tão duro "seco".

Vidas Secas: o título afronta duas formas de narrar(tendências narrativas) que pendem mais para se excluir do que para se unir. A primeira linha é a sociológica "secas" onde tenta fazer um romance realista regionalista; a segunda linha a psicológica "vidas", a do realismo psicológico. Impondo-se com o romance psicológico onde a análise se sobrepõe o documentário sociológico.

A seca não permite a vida vegetal, mata os animais e expulsa os homens, desumanizando-os e obrigando-os a aproximarem-se dos animais para todos juntos tentarem a sobrevivência comum. Assim entre Fabiano e a seca trava-se uma luta de um caráter especial, porque o vaqueiro "Fabiano" tem nela um inimigo que não pode combater diretamente mas por meios indiretos- fugindo. Para este combate a seca encontra ajuda "solidariedade" na cidade na luta contra Fabiano. E, Fabiano tem três fatores: a energia vital física, Deus e as ilusões que o ajudam a resistir a seca.

A energia vital física que lhe permite resistir aos obstáculos e que é indispensável preservar cautelosamente, sem esbanjamento inúteis, como aparece em "Mudança", em que Fabiano ao avistar o pátio "cerca" de uma fazenda sentiu vontade de cantar a sua alegria mas logo se conteve: "Calou-se para não estragar força"pág.12

Deus, Nossa Senhora, os santos e sinhá Terta com as suas rezas. Deus podia afastar alguns males, a reza da Ave-Maria reza forte "podiam esconjurar a seca e curar a novilha raposa que andava tresmalhada ". Fabiano e a família vão a igreja pelo Natal "Festa" rezam para esconjurar os malefícios e doenças do gado, mas

não reconhecem Deus como origem das situações más, por isso esperam dele as boas, como se ele "Deus" fosse um intercessor junto do Destino.

As ilusões como: um futuro melhor para os filhos, uma cama de varas, um bebedouro imaginário, isto são necessários para melhor lutar. Esta esperança no futuro não passa de uma forma de ganhar novas energias para vencer o presente, funcionando como narcóticos para encarar as dificuldades da seca.

Vidas Secas é um romance escrito em terceira pessoa, seu narrador é superior às personagens, pois tudo sabe, tudo vê, tudo pode narrar por que não coincide com nenhuma personagem, uma vez que está por detrás de todas como narrador implícito e oculto. O narrador está perfeitamente à vontade para narrar e contar de maneira intemporal, impessoal e sem quaisquer outros limites. Pois tudo é permitido.

O narrador assume quaisquer uma das cinco personagens: Fabiano, Sinhá Vitória, o menino mais velho, o mais novo e a cachorra "Baleia"; cuja linguagem das personagens não vão além de monossílabos, por isso não podem analisar nem se expressar sozinhas. Cada personagem é especialmente analisada no capítulo que lhe pertence, com título apropriado e colocado em relação com as outras nos outros capítulos.

No primeiro capítulo "Mudança" as personagens apresentam-se todas juntas e numa ordem cronológica: Fabiano, sinhá Vitória, o menino mais velho, o mais novo, a cadela "Baleia" e o papagaio. Sabendo-se que este capítulo é o resumo de toda a história, pois os detalhes de cada personagem será, dito no capítulo que pertence a cada uma.

"[...] Fabiano ainda lhe deu algumas pancadas e esperou que ele se levantasse. Como isto não acontecesse, espiou os quatros cantos,zangado, praguejando baixo"pág. 9

Isto é o comportamento do pai perante o filho mais velho. E no capítulo que lhe pertence o que aconteceu em "Mudança" é explicado com mais detalhe.

b"[...] Ele, o menino mais velho, caíra no chão que lhe torrava os pés. [...] Mal sentia as pancadas que Fabiano lhe dava com a bainha fada de ponta."pág. 59

Na caminhada que os retirantes fazem, o filho mais velho não consegue acompanhar por causa do sol forte e da fome que estão passando. Fabiano, o pai, fala alguma coisa monossilábica, mexe no filho e não tem resultado. No capítulo designado ao filho mais velho, isto é, posto com detalhes.

Na verdade, o narrador conta toda a história e a fala das personagens estão agregadas para que pareça seu pensamento. Fazendo uso da metalinguagem o narrador tem o conhecimento de toda a história e, faz uso da função fática para estabelecer um diálogo perfeito na relação narrador-leitor. Ao narrar o capítulo do "Menino mais velho" o narrador incorpora a personagem para o distanciamento não ser nítido.

A cachorra Baleia é humanizada, pois pensa, sonham tem consciência dos sofrimentos e da morte muito próxima dos seres humanos a que está agregada.

O apanhar um preá é dado como importante para a narrativa, a fim de encarecer o que isso vale com fator de sobrevivência para o grupo que caminha. Por isso o narrador dá uma grande importância a este episódio.

A cadela morre atingida pela hidrofobia(sarna), mas mesmo na execução deste castigo se afirma a violação da proibição por parte do sujeito, que não deixa o animal morrer por si mesmo, antes lhe dá o golpe de misericórdia, afirmando a sua contingência e liberdade contra a força necessária que o quer aniquilar. Baleia espera a morte sonhando com outro tipo de vida, ao lado de Sinhá Vitória, consegue elaborar seus devaneios.

Dado o caráter bivalente de Vidas Secas como romance regionalista e psicológico. A onisciência da terceira pessoa só atinge a amplitude nas descrições exteriores e sofre as limitações que faz equivaler à primeira pessoa.

Usando o caráter ambíguo das formas verbais(imperfeito do subjuntivo e do pretérito imperfeito e mais que perfeito do indicativo), o narrador narra como se comentasse e comenta como se narrasse. O imperfeito corresponde ao aspecto cursivo, definindo o desenrolar da ação ou a apresentação da qualidade como algo que dura e se desenvolve dentro dum determinado período de tempo e de importância.

O perfeito assinala que o modo de manifestação do processo indicado na enunciação ocorre num ponto determinado, concentrando o interesse do leitor de maneira instantânea e prende sua atenção para um momento de convergência.

No capítulo "Cadeia" isso fica claro "[...] Não queria( pretérito imperfeito) capacitar-se de que a malvadez tivesse sido( pretérito imperfeito do subjetivo) para ele. Havia ( pretérito imperfeito) engano, provavelmente o amarelo o confundira(pretérito mais que perfeito) com outro. Não era(pretérito imperfeito) senão isso.

Então por que um sem-vergonha desordeiro se arrelia(presente), bota-se(presente) um cabra na cadeira, dá-se(presente) pancada nele? Sabia(pretérito imperfeito) perfeitamente que era assim, acostumara-se(pretérito mais que perfeito) a todas as violências, todas as injustiças [...]"pág. 33

O início da narração é feita com os verbos no pretérito imperfeito do modo indicativo e no imperfeito do subjuntivo para demonstrar que é o narrador falando. Mas parece mais o pensamento da personagem por que depois, vem os verbos no presente, e no termino os verbos voltam ao modo indicativo "pretérito". Ao usar o pretérito mais que perfeito junto com o imperfeito gradua a importancia narrativa em relacao a um marco cronológico.

Mas ... como Graciliano Ramos faz uso do discurso indireto livre e agrega a personagem ao narrador; forjando, assim, um monologo onde apenas o narrador conta a história. Lembrando-se que as falas das personagens são monossilábicas, e o devaneio que são as falas do personagem parece o estado mental do narrador.

O tempo adquire um caráter lógico, porque as personagens sempre em movimento através da mudança continua dos estados: tanto física como psicológica. O tempo descontinuo se organiza no ritmo temporal do leitor moderno, o ritmo da vida precipitado e lento: precipitado por causa das frases curtas, enxutas, período simples, lento porque é cheios de vazios, sentidos densos.

As informações concretas são bem poucas, não são marcos absolutos e claros, mas relativos a outros marcos que se encadeiam em ate cedentes imprecisos.

"Entrava dia e saia dia" pág. 13

"Agora Fabiano era vaqueiro" pág. 19

O narrador situa o encontro com o soldado amarelo um ano depois do episódio da "Cadeia"

" [...] voltou-se e deu de cara com o soldado amarelo que, um ano antes, o levara á cadeia [...]" pág. 99

E no final do romance diz: "dobrando o cotovelo da estrada, Fabiano sentia distanciar-se um pouco dos lugares onde tinha vivido alguns anos, o patrão, o soldado amarelo e a cachorra Baleia esmoreceram no seu espírito" pág. 120

"Alguns anos" este plural indica que um ano é insuficiente para conter toda a matéria do romance ou a vida é um ciclo de retomadas.

Vidas Secas começa com uma fuga e acaba com outra, a ação fecha-se num circulo. A vida do sertanejo se organiza, do berço á sepultura, o perpétuo retorno.

E, para o narrador interessa apontar o mútuo distanciamento de determinado momentos de sucessão. Isto subtrai a cronologia do tempo criando um efeito psicológico.

Em Vidas Secas não há o contraponto entre o presente da escrita e o passado dos acontecimentos porque o narrador se dissimula perfeitamente por detrás do relato e aparece interessado em que o leitor se aperceba o menos possível de sua presença. É uma ocultação que não impede a relação narrador-leitor, mas a atenue bastante.

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